Amanhá, sábado 8N, às 20h30 o recém premiado Xurxo Souto acompanhará-nos a partilhar histórias e mitologia arredor das celebraçons tradicionais desta época outonal. O magusto, as caliveras de melom, o S. Martinho serám protagonistas na charla titulada “Martinho vs. Merlim”. Aqui vos deixamos um resumo feito polo Xurxo, para ir abrindo orelha…Xurxo_Souto_cadro

QUANDO SAM MARTINHO CONHECEU A  MERLIM

No século VI chegou até cá, Martinho, um crego disposto a fazer desaparecer da Galiza os ritos da antiga religiom. Trabalhou arreo mas, ainda hoje, agroma as vezes essa magia do Merlim que todos e todas levamos dentro. “As fogueiras do Sam Martinho”, assim intitulou Ramón Otero Pedraio o capítulo dedicado a Alta Idade Média do seu “Ensaio Histórico sobre a Cultura Galega”. Na noite de onze de novembro, nos montes que rodeiam Ourense, acendidos pelos magustos, albiscava o senhor de Trasalba fumes antigos. Som rexoubes dum tempo convulso no que a igreja de Roma tentava assentar os seus ritos sobre as velhas crenças. Desde crianças, Merddin faz parte do património dos nossos sonhos. Bem, como o nome das lendas galesas resultava cacofónico para os ouvidos franceses, foi adaptado -e assim chegou a nós-, com a forma de Merlim. Com a venia das e dos historiadores, no ouridourado Outono, façamos a apresentaçom formal entre o mago dos contos e o nosso Sam Martinho. Ambos os dous aparecem, trás o declive de Roma, em duas províncias extremas do antigo império. Britania, abandonada pelas legions, tem na espada de Arturo a sua última esperança. O rei jovem já segue a religiom da cruz, mas governa baixo o conselho de Merlim, derradeiro representante da antiga tradiçom. Na Gallaequia, Martinho também guia a umha criança bem nova, o rei Miro. E ao seu lado, tenta salvar o reino galaico-suevo da destruiçom. Mas Martinho de Dume é antítese do sábio britano. Depois da sua estadia em Roma, chegou desde as Galias até estas terras de nevoeiro com o firme propósito de que as pessoas que a habitavam abandonassem de vez as velhas crenças. Nestas terras extremas trabalho nom lhe faltava. Dentre o povo suevo da corte de Miro devia erradicar definitivamente a heregia arriana. E, sobretudo, teimava por afastar ao vulgo da Gallaecia das suas antigas práticas de adoraçom à natureza. Ritos enguedellados agora com a doutrina do herege Prisciliano, o bispo galego decapitado em Tréveris. Para a gente da aldeia -em latín “pagus”-, isto é para os  “pagáns” e as “paganas”escreveu Martinho o seu discurso mais famoso: “De correctione rusticorum”. Nele dizia-lhe os e as galegas de entom que tinham de deixar de adorar às pedras, aos montes, que nom existiam espíritos nas fontes, nem havia nada mágico nos encruzamentos… Numha ocassom teve notícia de um lugar onde a gente adorava a um grande pinheiro, pois nas suas pólas habitava um “demo” de muito poder. Imediatamente Martinho achegou-se com a machada. Diziam-lhe que estava louco, que o demo faria cair a árvore acima dele com resultado de morte segura.  Mas o de Dume continuou petando até que deitou no chão o pinheiro enfeitiçado: amostra pública do triunfo definitivo da nova religiom. A sona do caso foi imensa. Eis o seu nome: Sam Martinho Pinario, –  de”pinus” em latim-, isto é, Sam Martinho “o do pinheiro”. As suas teimas alcançaram até o mesmo calendário. No “de correctione rusticorum” também proibia expressamente utilizar os nomes de deusas e deuses pagáns para denominar os dias da semana. No lugar de “luns” -dia da Lua- ou ” martes” -dia de Marte-, havia que dizer “segunda-feira”, “terça-feira…”, conforme se segue fazendo hoje em alguns lugares da Galiza e em todo Portugal. Abofé que foi fecundo o trabalho de Martinho. Mas, apesar de todos os seus esforços, constantemente agroma em nós a magia de Merlín. Escutei-lho numha parolada a Manuel Rivas. Martinho proibia-nos adorar às pedras e aos astros, dizia que nom tinham alma as fontes, que nenhum espírito habitava nos pinheiros… E treze séculos depois escreve Rosalía de Castro: “Dicen que non hablan las plantas, ni las fuentes, ni los pájaros,/ ni la onda con sus rumores, ni con su brillo los astros./ Lo dicen, pero no es cierto, pues siempre cuando yo paso,/ de mi murmuran y exclaman: -Ahí va la loca soñando…” As fogueiras do Sam Martinho, lumes de longe que seguem a enfeitiçar-nos cada Outono. DOIS SANTOS PARA A MANTANÇA Em rigor o dia onze de novembro nom se celebra a festa deste Martinho mas a de seu mestre, Sam Martinho de Tours, santo da parte das Galias. Era soldado romano e por isso se lhe representa partilhando com um pobre a sua capa encarnada. Um rei suevo -que daquela seguia a heregia arriana-,  conseguiu a cura do seu filho por mediaçom deste santo. Imediatamente o reino galaico-suevo converteu-se ao catolicismo. E chegou desde as Galias -com reliquias do de Tours- o nosso Martinho. O de Dume reorganizou a igreja galega e encheu todos os recantos de freguesias que tenhem ao outro Martinho como santo padroeiro. Como prêmio ao seu grande esforço, a onomástica do seu mestre -o de Tours- coincide com a festa doméstica da matança. Ainda que bem mirado, nom haverá armadilha no conto? Pode existir rito mais pagano que a gloriosa apoteose das carnes porcinas ? Nom sei o que pensaria o autor de “De correctione rusticorum” sobre o assunto…